segunda-feira, 28 de abril de 2014

ESMERALDINA CARVALHO CUNHA [1]


Esmeraldina Carvalho Cunha foi encontrada morta na sala de sua casa, em Salvador, em 20 de outubro de 1972, aos 49 anos. Seu corpo estava pendurado num fio de máquina elétrica. Esmeraldina fora casada com Tibúrcio Alves Cunha Filho, com quem teve cinco filhas. A mais nova, Nilda Carvalho Cunha [2], havia morrido um ano antes, em 14 de novembro de 1971, após dois meses de prisão e torturas em Salvador. Outra filha, Leônia, foi militante do PCB e da Polop. Lúcia também chegou a ser presa, mas foi logo solta. A mais velha, Lourdes, foi cruelmente assediada durante muito tempo por agentes do Exército, o que lhe causou sérios problemas emocionais e comportamentais.
Esmeraldina, mãe exemplar, separada do marido, lutava pela vida de suas filhas militantes. A dor pela morte de sua caçula, Nilda, a transtornou. Mas seu suposto suicídio sempre foi questionado pela família. Sua filha mais nova fora presa na madrugada de 20 de agosto de 1971, juntamente com Jaileno Sampaio, seu namorado, na casa onde foi morta Iara Iavelberg [3], conforme descrito na chamada Operação Pajuçara, organizada pelos órgãos de segurança "para capturar ou eliminar" o guerrilheiro Carlos Lamarca. Assim que soube da prisão de Nilda, Esmeraldina revirou a Bahia. Procurou os comandantes militares, o juiz de menores, advogados, tentou romper a incomunicabilidade imposta pelo regime. Só conseguiu ver a filha tempos depois, na Base Aérea de Salvador, quando a encontrou em estado lastimável, em consequência das torturas. 
Esmeraldina enfrentou, por duas vezes, o major Nilton de Albuquerque Cerqueira, um dos carcereiros da filha, conforme relata o livro "Lamarca, o capitão da guerrilha", de Emiliano José e Oldack Miranda. Na primeira vez, o major tentou impor como condição para a soltura de Nilda que a mãe voltasse a viver com o ex-marido, fato que não se concretizou e quase impediu a liberdade da filha. Na segunda vez, o major esteve no quarto de hospital em que Nilda, já em liberdade, estava internada para tratamento. Sua presença e as ameaças de fazê-la retornar à prisão agravaram o estado de Nilda, que morreu dias depois, em circunstâncias nunca esclarecidas.
Esmeraldina não suportou a morte prematura da filha caçula, entrou em depressão profunda e foi internada no sanatório Ana Nery. Ao sair, passou a buscar desesperadamente as pessoas que poderiam esclarecer o que ocorrera com Nilda: seu médico, que viajara para a Europa, e os diretores dos hospitais onde estivera internada. Não encontrava ninguém. 
Oldack Miranda e Emiliano José descrevem em seu livro: “Ela não se conformava com a morte da filha, chorava, andava pelas ruas da cidade, delirava e gritava: – Eles mataram minha filha, uma criança! Eles mataram minha filha. São assassinos, do Exército, do governo. Estão matando estudantes... Até que aparecia alguém e a levava para casa. Mas em qualquer lugar recomeçava de repente a gritar, a falar contra o governo. Incomodava”.
Em certa ocasião, quando bradava pelas ruas a morte de Nilda, Esmeraldina foi detida por uma radiopatrulha, levada à Secretaria de Segurança Pública e liberada por intervenção de uma amiga que a vira chegar presa. Recebeu, tempos depois, a visita de um estranho, que lhe levou um recado: “o major mandou avisar à senhora que se não se calar, nós seremos obrigados a fazê-lo”. Mas Esmeraldina não se intimidou e não se calou – as praças e ruas de Salvador continuaram a acolher sua angústia e suas denúncias. A Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP) fez diversas diligências na busca pela verdade, mas nenhuma informação adicional foi acrescida ao processo que, além do relato, contém depoimentos de alguns dos amigos que viram os protestos em praça pública e tiveram conhecimento das ameaças que sofria.
O relatório da CEMDP constata que a angústia e o desespero pela morte da filha deixaram Esmeraldina inconsolável. Destaca, ainda, o relato da filha Leônia de que a mãe, um dia antes de morrer, comprara móveis novos para a casa e, ao encontrá-la dependurada, pudera ver que havia marcas de sangue no chão, sua face não estava arroxeada, sua língua não estava para fora, não houvera deslocamento da carótida e mal trazia marca do fio no pescoço.
A CEMDP considerou que a morte de Esmeraldina Carvalho Cunha se deu em consequência de seus atos públicos contrários aos interesses da época, resultantes de seu inconformismo e de seu conhecimento das atrocidades praticadas por agentes do poder público.

[1] As informações dessa descrição foram retiradas do livro: “Luta: Substantivo Feminino”. Nós do Violeta Parra temos o Livro em PDF, se houver interesse basta pedir-nos. 

[2] Também postamos aqui sobre Nilda Carvalho. Para consultar acesse o link: http://coletivodegenerovioletaparra.blogspot.com.br/2014/04/nilda-carvalho-cunha-1954-1971-1.html

[2] Também postamos aqui sobre Iara Iavelberg. Para consultar acesse o link: http://coletivodegenerovioletaparra.blogspot.com.br/2014/04/blog-post.html

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